28 de fevereiro de 2012

Três questões para o teatro em Belém



O Teatro em Belém necessita ter sempre em vista três (3) questões. Deixo de fora - sem negar a importância - algumas questões estruturais da administração pública como a pouca disponibilidade de espaços de apresentação e a carência de incentivos públicos. Gostaria de sair um pouco do velho "Eles não ligam pra nós" se me permitem. Adiante.

1 - Investimento em publicidade dos espetáculos

Quando digo para um desconhecido que faço Teatro ouço, quase sempre, a mesma pergunta: "Ah, você é do Verde-ver-o-peso?". Nada contra esse clássico do teatro paraense mas isso evidencia o quanto o público desconhece a maior parte dos trabalhos feitos pelos criativos grupos da cidade. O espetáculo do Grupo Experiência está há décadas em cartaz e não há como se comparar nesse quesito. A questão que quero colocar é que muitas vezes falta investimento na divulgação dos espetáculos. As redes sociais abriram uma possibilidade maravilhosa, porém a melhor forma de divulgação - além das matérias em sites e jornais e dos cartazes e folders passados de mão em mão -  ainda é a velha e eficiente propaganda, seja em rádio, TV ou em outdoors. Aí você pergunta com toda razão: "Com que dinheiro?" É aí que está. Eu mesmo já me convenci de que não dá pra fazer teatro em Belém na expectativa de um retorno financeiro sem a ajuda dos recursos de uma mídia ostensiva. Existem casos excepcionais, é claro. Mas as produções, em especial a dos grupos sem uma platéia cativa numerosa, podiam pensar com carinho em um dia investir (ou direcionar, nos casos de espetáculos subsidiados por recursos públicos) na venda do seu trabalho como um produto, possibilitando que a platéia venha a ser composta um dia por mais dos que os parentes e amigos mais próximos. Falando em espetáculos subsidiados, acho um absurdo que muitos dos editais não tenham uma cláusula exigindo que os grupos invistam parte dos recursos destinados para a publicidade dos espetáculos. É preciso comprar - literalmente - a briga pela atenção do espectador em tempos de internet, DVD e TV a cabo. Se pudesse simplesmente optar em ter mais dinheiro para montagem, para pagar atores e técnicos OU para divulgação dos meus espetáculos, eu escolheria sem pestanejar este último. Teatro é para ser visto. 

Investimento em publicidade também é um problema no item 2.

2 - Festivais de Teatro regionais e nacionais

Festivais são eventos caros. É louvável o esforço dos que organizam festivais e mostras de teatro em Belém e no interior, com ou sem recursos públicos (raríssimos!), periodicamente ou não. No entanto, tem falhas em quase todos os festivais que atentam contra os objetivo principal dos próprios festivais que são a formação de platéia e o intercâmbio entre o fazer teatral entre cidades, estados ou países diferentes. A formação de platéia é PREJUDICADA pelo investimento deficiente na publicidade dos festivais. Um festival que se preze tem que ambicionar PARAR uma cidade para que ela o veja passar. O que acontece de fato - como aconteceu no último e único Festival Nacional de Teatro promovido no ex-governo estadual petista - é que praticamente apenas os artistas ficam sabendo dos festivais. Os festivais ficam parecendo mais jogadas políticas para ganhar status com a "classe" do que um compromisso verdadeiro com o público. Este, do centro e da periferia, fica quase que completamente alheio aos acontecimentos, perdendo a oportunidade de comparar a produção local - como no caso do Festival Nacional - e perceber que muito do nosso teatro não deve nada em contraste com a qualidade dos grupos convidados, como por exemplo, os dos grandes centros como SP. Quantas vezes não fiz essa pergunta para pessoas de cantos variados da cidade, da classe A, B ou C, durante esses festivais: "Você sabia que está ocorrendo um Festival de Teatro na cidade?", e a resposta: "Não... Quanto é?", ao que devolvia: "É de graça, pô!" O que evidencia uma triste dinâmica: a "classe" vai aos Festivais e leva os amigos mais próximos. No entanto, a dona Menina lá da Terra Firme que sonha em levar os netinhos ao teatro não sabe até hoje que por aqui existiram festivais. Prova de que o povo quer ir ao teatro foi a passagem dos SESI Bonecos pela cidade arrastando multidões mesmerizadas com um simples: entrada franca. É claro que o SESI investiu milhares e milhares de reais mas também não dá pra formar platéia pensando em avisar só o periquito e o papagaio da vizinha. Os festivais devem ter como missão fazer com que as cidades se apropriem da diversidade de suas produções e, sentindo-se orgulhosos delas, se lembrarem de que pode ser recompensador investir nos grupos locais. Sonho em um dia me surpreender com minha vizinha vendo o quanto eu me esforço na platéia de um festival. Mas ela só vai comparecer se visualizar um outdoor no seu bairro, ouvir no rádio ou ver na TV. Ou se eu avisar ela.

O intercâmbio entre os fazeres teatrais é o assunto do item 3.

3 - Quando vai nascer um crítico teatral nessa cidade?

É fato. Belém precisa urgentemente de críticos teatrais. Não precisa ter qualidade pra começar: que venham os toscos, os pedantes, os ignorantes, os trolladores, os cruéis, os desonestos, etc. A verdade é que eles precisam aparecer e colocar a produção local em debate. É só através do debate que a mesma crítica teatral vai se aperfeiçoar e realmente começar a beneficiar o trabalho dos artistas. É muito louvável a iniciativa do Orlando Simões do site Ponto Zero com o seu foco na semiótica dos textos. Contudo, a produção precisa refletir não só o trato com a dramaturgia, mas também os esforços da direção, a criatividade ou não dos técnicos, a insegurança dos atores, o equívoco das produções, etc. Eu me pergunto porque a Escola de Teatro da UFPA não forma críticos com tanto o que tem de teoria no currículo dos seus cursos. Nunca passou pela cabeça de nenhum egresso desta, ao perceber que apesar dos esforços para se encaixar como ator ou técnico, que poderia também mergulhar em estudos naquela biblioteca para se arriscar a escrever sobre o que vê nos palcos da cidade? Ou será que todo mundo nessa cidade só pensa em brilhar na ribalta? Servir ao teatro apaixonadamente pode comportar muito bem a atividade profissional de um crítico sem medo de pisar em ovos. Os grupos sérios com trabalhos coerentes merecem ser reconhecidos e os claudicantes merecem sim umas bordoadas. É a ausência de diversidade do debate intelectual que nos separa dos grandes centros muito mais do que o destino dos recursos públicos. No último Festival Territórios de Teatro, quando o Teatro do Ofício participou com o espetáculo "Uma Flor para Linda Flora" de Carlos Correia Santos, constatamos, surpresos e decepcionados, que não teria crítica teatral opinando. Foi um balde de água fria. Para mim, ao menos, foi um prazer incompleto, apesar da platéia maravilhosa, fazer um esforço do cão para não ter um só minuto de reflexão sobre o resultado de 2 anos de trabalho. Teve cachê mas saímos mais pobres do que entramos. Sonho em ter meu trabalho esculachado por um crítico em uma Belém que só tem sorrisos e tapinhas nas costas. O público, mais uma vez, perde a oportunidade de comparar o nosso trabalho graças ao provincialismo em se preservar mais o amor da "classe" do que a busca da perfeição. 

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Longe de mim achar que tenho soluções e que sei o que é o certo para o Teatro feito em Belém. Também não tenho nenhuma militância teatral (no sentido reivindicatório da coisa) para me servir de atestado de autoridade. O que tenho é a minha lida com os problemas do palco como ator ou, mais recentemente, como produtor e diretor dos meus trabalhos no Teatro do Ofício.  É bom esclarecer que tudo o que eu opinar aqui também vale para mim. Tenho o ponto de vista do meu fazer teatral com alguns sucessos e um desfile infindável de fracassos maravilhosos que enriqueceram a minha alma e empobreceram os meus descendentes. Evoé.




Um comentário:

  1. acho que vc tem talento para a crítica teatral: mãos à obra!
    abç
    marton

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O único troll aqui sou eu!!!