19 de março de 2013

Fist Fucking



A obra é interessante. Mas é um sintoma dos nossos tempos - como Lady Gaga. Perspicaz a opinião da Sarah Fernandes de que "o título da minha dúvida deixa mais ou menos claro que a obra abaixo está mais próxima à representação de uma época onde o homem puxa o próprio saco e casa-se com o próprio espelho em favor da "própria liberdade", do que uma representação que possa gerar contemplação"

Exatamente. Não parece ser uma obra que busca inspirar virtudes em primeiro lugar, mas espelhar um 'zeitgest', um estado de coisas. Se a arte há de ser bem-feita ou mal-feita, jamais boa ou má em si, como insinuou Oscar Wilde, podemos dizer que ela consegue o seu intento.

Li em um antigo ensaio da Revista Bravo um insight bem interessante sobre a arte que se diz contemporânea, tão bem expressa em suas excentricidades na Bienal de São Paulo. Sobre a Bienal paulista de 98, disse Teixeira Coelho: 


"Recordo conto de Borges sobre o cartógrafo que desenhava um mapa tão abundante que o tamanho do papel era o mesmo do terreno representado: escala um por um. Essa fábula serve como imagem de parte da arte contemporânea, herdeira renitente de uma sociedade da abundância já finda e que não faz economia de meios - acaso não de propósito, mas por deficiência representacional. Esses ambientes constroem-se por metonímia (aproximação no espaço entre um signo e outro, uma coisa e outra), enquanto a grande arte ainda seja ainda aquela que procede da metáfora, substituição da coisa por um signo. Metáfora, operação que cria, versus metonímia, operação que combina o já existente."


Não sei vocês, mas gosto da instalação acima. Gosto de pensar que o Dragão passou e deixou no caminho um rastro de homens orgulhosos de achar que tudo podem dar a si, nem que seja a boa e velha fellatio (do qual escutei uma vez chamarem-na de 'o apogeu do sexo'). Recordou-me uma peça bem polêmica de Newton Moreno, levada aos palcos por Renato Borghi e Élcio Nogueira Seixas, onde dois homens encontravam-se para praticar o fist-fucking (prática de penetrar o alheio com o punho). A peça, muito bem escrita e representada, mesmo levando a risos nervosos, tinha um quê melancólico de metaforização da busca do homem por um sentido mais profundo (ui!), acessível para muitos apenas como perversão sexual.

Nunca esqueçam que há mais nus hoje na Capela Sistina do que em Hollywood.

Agora comparem a obra abaixo com a que eu vi na Bienal de São Paulo do ano passado, tortura que apreciei na companhia do meu querido cicerone Francisco Souza. Um carrinho de brinquedo batendo contra um pedaço 
de bolo sob uma tábua mais ou menos inclinada.





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9 de março de 2013

As drogas e o suicídio da personalidade



Inspirado pelo depoimento emocionado e cortante da mulher do infeliz vocalista da banda Charlie Brown, o tal Chorão, escrevi essa postagem no perfil do meu Facebook. É o motivo principal pelo que eu não gosto de drogas. Perdi grandes amigos para o poder corruptivo dessa merda. Uma perda, para mim, pior que a da morte. Leiam:

"Drogas matam. Sim, matam. Mas isso não é o pior efeito da droga em nossa sociedade. O drogado que morre alivia-se a si próprio e os que estão ao seu redor tragicamente. A droga vai além. A droga piora o que há de pior em nós. Cada uma delas tem o seu pecado favorito: algumas promovem a luxúria, outras a gula, ou a ira, ou a preguiça. Mas todas sem exceção - depois que debilitam o livre-arbítrio, o discernimento mental e a saúde física das pessoas - promovem a avareza, a inveja e principalmente o orgulho - pecado demoníaco por excelência: o pecado da vaidade desmesurada, da tentação do maldito sob pretexto de pureza, da falsa superioridade existencial por desafiar a realidade ainda que ela seja a dos limites do próprio corpo. Para justificar o prazer da droga, o drogado começa a achar aceitável a relativização de tudo. Para sustentar o vício começa a achar relativa a necessidade de ser avarento com o que tem ou com o que pode obter para poder gastar altas somas com a sua 'viagem; passa a invejar os que obtém os mesmos bens necessários ao seu prazer caindo facilmente na tentação das ideologias utilitaristas; e, finalmente, chega à negação de toda falta de controle por parte de suas faculdades mentais e espirituais, agravando ainda mais a sua demência existencial em um arroubo de orgulho desmesurado imune a qualquer admoestação. Essa corrupção íntima afeta gravemente as relações dessas pessoas consigo próprias e com o mundo de forma tão incontrolável e avassaladora que nada mais resta a elas que não se agarrar a um solipsismo suicida que, com sorte, é aproveitado por algo ou alguém; mas que, na maioria das vezes, leva mesmo é à destruição total da personalidade. A droga pode levar a mortes bem mais prolongadas e dolorosas."